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Jaru, 1 de maio de 2024

Ex-analfabeto com 8 filhos já cedeu a casa no lixão para ser usada como escola para comunidade

“Porque há nas tuas mãos, meu velho pai, essa beleza que se chama simplesmente vida”. A frase do poema “As mãos de meu pai”, de Mário Quintana, é digna da história de pais como o borracheiro e reciclador Francisco Rodrigues Fontineli, morador da Vila Princesa, onde funciona o lixão de Porto Velho. 

Aos 70 anos de idade, nascido na capital e criado no interior do estado, seu Francisco voltou para Porto Velho para trabalhar como borracheiro. Mas a vida difícil e de poucas oportunidades, levou o homem, já casado à época, para trabalhar com reciclagem no antigo lixão da cidade, que funcionava próximo ao atual cemitério Santo Antônio. 

Foi lá, que desde muito cedo, os oito filhos de seu Francisco começaram a aprender o ofício do pai. “Eu não pensava muito em como seria a vida deles, nem ficava imaginando o futuro, só pensava em sustentar a casa e ‘dar o de comer’ a eles, e queria que eles estudassem”, lembra. O homem teve que enfrentar a realidade. O lixão foi transferido para onde atualmente é chamado Vila Princesa. 

“Isso foi há 26 anos, aqui só tinha matagal, então eu vinha para trabalhar e minha mulher ficava na cidade com os meus filhos. Começamos a construir o barraco aqui e aí vieram todos. Não tinha nada, nem escola para os meninos”, conta o idoso. Mas mesmo sem estudo, mal sabendo assinar o próprio nome, seu Francisco procurou as autoridades para a criação de uma escola. 

“A luta foi grande. Não tinha lugar para isso. Cedi minha casa, que quando chovia alagava tudo. Com o tempo os moradores se juntaram e começamos a construir um lugar melhor, onde hoje a prefeitura mantém e tem tudo que as crianças precisam para estudar, até poderia ser melhor, mas pelo menos não estão sem estudo”, diz emocionado o homem que acabou também sendo beneficiado com a própria iniciativa.

Seu Francisco foi eleito presidente da Vila pelos moradores em 2001. “Eu pensei: e agora, meu Deus, como é que eu vou assinar alguma coisa se não sei ler nem escrever? Foi aí que eu também fui estudar na escola que, eu, nós mesmos construímos. Se hoje sei ler e escrever pelo menos um pouco, foi aqui na Vila Princesa que aprendi”.

O homem tem orgulho do que plantou, mas também chora a morte dos entes queridos. “Criei meus filhos ensinando a trabalhar e a serem honestos. A maior dor que tive na vida foi perder minha menina mais velha. Ela morreu atingida por uma descarga elétrica e deixou duas netinhas para nós. Há sete anos perdi minha esposa e, uma semana depois, minha mãe. Não tem dor maior do que essa, mas graças a Deus consegui criar meus filhos e ensinar o caminho correto, nunca passamos fome, sempre tivemos algo para comer”.

Raimunda Lopes, 41 anos, é uma das filhas de seu Francisco e diz que a educação dos filhos sempre foi muito importante para ele. “Ele sempre incentivou como pode. Quando eu vim morar aqui, a Unir ofereceu para os jovens um curso parecido com o Educação Para Jovens e Adultos, e foi assim que eu terminei o nível médio”, lembra.

Nelson Alves Lima, 45 anos, agradece ao pai pelo exemplo. “Ele sempre foi tranquilo, sempre trabalhando, nos ensinou a profissão de borracheiro e a reciclagem. Eu tento pelo menos seguir a metade do exemplo dele como homem e pai”. 

O idoso diz que se pudesse dar um conselho aos pais e aos filhos de hoje, seria “que os pais incentivem seus filhos a estudar, porque sem estudo não somos ninguém, e aos filhos que valorizem a oportunidade que os pais estão lhes dando porque com certeza é a melhor que eles podem dar”.

Ex-analfabeto com 8 filhos já cedeu a casa no lixão para ser usada como escola para comunidade
Seu Francisco com filhos, neta e bisneta (Vanessa Farias/Rondoniagora)

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