Você se sente inchada, mal-humorada, sem paciência. Olha no calendário e percebe que a menstruação logo vai chegar e entende o porquê das mudanças, afinal elas costumam aparecer todos os meses. A TPM (Tensão Pré-Menstrual) é comum à maioria das mulheres – estudos apontam que dois terços das mulheres que menstruam sofrem com ela. No entanto, há uma parcela dessa população que possui mais do que alterações “normais” aos dias que antecedem a menstruação.
Há mulheres que “se transformam em outra pessoa”, com explosões de raiva, crises de ansiedade, sensação de tristeza profunda, insônia, fadiga, perda de apetite e falta de ânimo para atividades do dia a dia, até mesmo para aquelas que dão prazer – o que inclui atividade sexual, por exemplo. Sintomas que tentem a desaparecem com o fim da menstruação. É como se a mulher tivesse uma depressão cíclica, bem mais forte que os sintomas comuns da TPM.
Essas mulheres podem sofrer de um transtorno chamado TDPM (Transtorno Disfórico Pré-Menstrual), que em 2013 foi incluído na categoria de transtornos depressivos e de ansiedade da DSM5 – a 5ª edição do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais, sigla em inglês, da Associação Americana de Psiquiatria. Estudos epidemiológicos estimam que entre 2% e 10% das mulheres que menstruam sofrem de TDPM – as porcentagens variam de acordo com as condições sociais em que a mulher está inserida.
A microempresária Cyntia Leite Martins, 28, teve diagnóstico da doença este ano. Ela conta que depois que teve gêmeos, aos 26 anos, começou a sentir uma forte alteração de humor nos dias que antecediam a menstruação. “Era chegar uma semana antes da menstruação para ficar muito irritada, fora de mim. Eu agia como se alguém estivesse apertando o meu pescoço ou fazendo algo muito absurdo, mas depois que passava a menstruação em pensava ‘porque eu agi dessa maneira?'”, conta.
Cyntia se sentia deprimida, estressada, chorava com facilidade e tinha até pensamentos suicidas. “Eu não queria mais viver quando estava no período pré-menstrual. E esse pensamento passava depois da menstruação”, conta.
Os baixos níveis de estrógeno no corpo da mulher e na elevação de progesterona durante esse período do mês são as causas para as alterações de humor. “Dada essa concentração mais baixa de estrógeno, a mulher vai ter menos dopamina (neurotransmissor relacionado ao humor e emoções) disponível e com isso uma maior predisposição a um humor deprimido e com todos os correlatos que acompanham esse humor”, explica a sexóloga, fundadora e coordenadora do ProSex (Projeto Sexualidade) do Hospital das Clínicas de São Paulo, Carmita Abdo.
No entanto, não há uma explicação de porque quem tem TDPM desenvolve alterações mais graves pela falta de dopamina que outras mulheres que também sofrem a mesma oscilação hormonal. “As causas exatas são desconhecidas, mas existem hipóteses. Uma sugestão seria predisposição genética para transtornos depressivos”, explica José Carlos Appolinário, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria da UFRJ.
Appolinário afirma, no entanto, que as mulheres precisam ter cuidado antes de pensar que têm TDPM. “As mulheres normalmente percebem que tem TPM, porque ficam irritadas, com alterações de humor. Por isso, antes de pensar que tem TDPM é importante que haja um acompanhamento de pelo menos dois ciclos (menstruais) seguidos”, adverte.
O coordenador do Centro de Reprodução Humana do Hospital Sírio-Libanês, Maurício Abraão, que é professor associado da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), também afirmou que é preciso ter cuidado na hora de diagnosticar a TDPM.
“A inclusão da TDPM na categoria de transtornos depressivos da DSM5 foi um avanço para o tratamento de mulheres que têm uma depressão importante nesse período, mas a definição de um transtorno depressivo não é matemática, sempre tem uma grande subjetividade no diagnóstico. Por isso é preciso atentar para quadros intermediários, já que os graves são mais fáceis de definir”, afirma.
Tratamento
Depois de ter problemas com o marido e de começar a ser vista de maneira diferente pela filha de 4 anos, Cyntia conta que “encostou a ginecologista na parede” para ela resolvesse o seu problema. A médica receitou um antidepressivo, o que assustou Cyntia. Ela afirma que não queria passar a vida inteira tomando o medicamento e buscou ajuda em tratamentos alternativos.
A professora-titular de Psicofarmacologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Helena Maria Calil, livre-docente em Psiquiatria, explica que o principal tratamento contra o transtorno é o antidepressivo. “Eles ajudam a melhorar, e muito, os sintomas pré-menstruais. Em muitos casos, não há necessidade de que a mulher tome diariamente o medicamento, basta tomar depois do período da ovulação, 10 a 14 dias, ou até menos, dependendo do ciclo”, explica.
A duração do tratamento varia. Há mulheres que consegue controlar o transtorno e deixam de usar a medicação e outras que precisam tomá-la até a menopausa. Atividades físicas e técnicas de relaxamento também fazem parte do tratamento. “As pílulas anticoncepcionais ajudam porque dão certo equilíbrio na distribuição de estrogênio e progesterona’, acrescenta Appolinário.
Calil afirma ainda que o ginecologista pode tratar a paciente, mas o ideal é uma avaliação psiquiátrica. “A mulher geralmente é acompanhada durante anos pelo mesmo ginecologista, que a conhece bem e pode avaliar se a alteração que ela relata é mesmo intensa e pode receitar o tratamento. Mas, o ideal seria que ela fosse avaliada pelo psiquiatra, para poder avaliar cuidadosamente a gravidade dos sintomas, de acordo com os critérios diagnósticos de TDPM”, explica.