O objetivo principal foi aproximar os importadores dos cafeicultores locais por meio de rodadas de negócios e da imersão proporcionada.
Entre os dias 27 de agosto e 2 de setembro, em ação inédita, uma comitiva internacional de compradores de cafés de 11 países e mais do Brasil esteve em Rondônia para uma imersão na origem dos Robustas Amazônicos, incluindo a apresentação de toda a biodiversidade e as riquezas culturais que a Amazônia possui e que dão a estes cafés sabores únicos.
Esta ação faz parte do programa Exporta Mais Brasil, da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos – ApexBrasil, que busca fortalecer a cultura exportadora de diferentes setores produtivos do país. Em Rondônia esta ação contou com a organização da Associação dos Cafeicultores da Indicação Geográfica Matas de Rondônia – Caferon e da Embrapa, assim como teve o apoio da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico – Sedec, do Sebrae, da CNA e do Selva Café.
O evento ocorreu em Cacoal, com ações itinerantes em outras localidades da Indicação Geográfica (IG) Matas de Rondônia, como em Novo Horizonte D’Oeste. O objetivo principal foi aproximar os importadores dos cafeicultores locais por meio de rodadas de negócios e da imersão proporcionada. Ao provarem a qualidade dos cafés e conhecerem de perto a realidade da região e dos produtores, os compradores puderam estreitar relações e muitos fecharam negócios ainda durante o evento. De acordo com levantamento da Caferon, foram comercializadas cerca de 3 mil sacas de café de 15 produtores de pequeno e médio porte, incluindo mulheres e indígenas, totalizando mais de R$4 milhões em negócios.
Para se ter dimensão, uma saca de café da espécie canéfora (robusta e conilon) está sendo comercializada por cerca de R$600 no mercado de commodities. Já os cafés deste evento foram comercializados, em média, por R$1500, tendo sacas vendidas por até R$4 mil. “Foi uma oportunidade única para os cafeicultores. Além da qualidade dos cafés degustados, os compradores puderam conhecer a realidade da região, o quanto a ciência e tecnologia estão envolvidas em todo o processo e o trabalho sério que estamos fazendo em prol da sustentabilidade em seu tripé econômico, social e ambiental”, explica o presidente da Caferon e produtor Juan Travain.
Segundo o pesquisador da Embrapa Rondônia, Enrique Alves, a grande transformação que a ciência proporcionou para a cafeicultura foi uma nova identidade aos cafés produzidos na região: Robustas e Amazônicos. A denominação Robusta Amazônico não foi dada ao acaso, foi embasada em pesquisa, dando origem a um novo produto para a cafeicultura brasileira. “São novos materiais genéticos e tecnologias de pós-colheita que proporcionaram o surgimento de uma paleta sensorial única e genuína”, argumenta Alves. Ele complementa dizendo que os cafeicultores da Amazônia continuam se apoiando na ciência para romper os desafios e oferecer ao mundo um produto fino, sustentável e com grande apelo social”, argumenta Alves.
De acordo com o representante da ApexBrasil Norte, Essio Lanfredi, a presença destes compradores em Rondônia é fundamental para que conheçam os Robustas Amazônicos, a IG Matas de Rondônia. “Esta imersão é determinante para que o mundo possa reconhecer a relevância da produção do café na Amazônia, realizada de forma sustentável, com qualidade e com a atuação de produtores de base familiar, incluindo mulheres e indígenas e compreender como a região Amazônica está sendo beneficiada com a produção destes cafés”, aponta Lanfredi.
“Este é, sem dúvida, um marco histórico para os Robustas Amazônicos! Percorro o mundo há anos em ações voltadas para o café e posso afirmar que os compradores saíram com a melhor das impressões”, afirma o cafeólogo Edgard Bressani, que também é CEO de uma empresa de exportações. Segundo ele, a quebra de paradigma de que o café da espécie canéfora não produz boa qualidade já aconteceu há alguns anos, mas que a diversidade de sabores que puderam provar nas xícaras do cafés selecionados foi algo inusitado e marcante para todos, o que pode ser percebido nas avaliações feitas por eles durante o evento. “Acredito que estes compradores serão embaixadores destes cafés em seus países, compartilhando o que vivenciaram em Rondônia”, complementa Bressani.
O evento
A delegação de compradores internacionais vindos Grécia, Bélgica, Reino Unido, China, Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Armênia, Paraguai, Canadá, Estados Unidos e África do Sul pode degustar os cafés Robustas Amazônicos em ações denominadas cuppings. Todos os cafés que participaram foram selecionados por avaliadores profissionais (R-graders), seguindo padrões internacionais de qualidade. Os cafeicultores foram incluídos no evento desde a chamada pública para envio de amostras de cafés para possível comercialização como também nas diversas ações realizadas durante o evento, como nas degustações dos cafés selecionados, em que os cafeicultores tiveram também a oportunidade de saber a avaliação dos compradores sobre seus cafés e negociar diretamente. No total, participaram do evento 22 produtores de cafés Robustas Amazônicos, sendo três deles do Acre e o restante de Rondônia.
Além disso, foram realizadas visitas às áreas de cafeicultores campeões em qualidade da IG Matas de Rondônia, em que os compradores puderam vivenciar experiências que envolvem a produção destes cafés especiais – do campo à xícara. Também puderam acampar em uma pequena propriedade de café, rodeada pela floresta Amazônica e em meio ao cafezal. A gastronomia da região também foi incluída em todo o evento, como um reflexo da cultura local.
O turismo rural, que já está sendo realizado em torno da cafeicultura, foi apresentado à comitiva em uma visita à família Bento, em Cacoal, que já desenvolve esta ação. Mais de 2 mil pessoas visitam por mês esta propriedade, premiada em qualidade e sustentabilidade, que tem cerca de 10 hectares de café e em que o turismo se tornou fonte relevante de renda para as cinco famílias que trabalham nesta área. Merece destaque também o etnoturismo na aldeia Lapetanha, da etnia Paiter Surui, proporcionando uma vivência em uma aldeia indígena que produz cafés com qualidade, uma vez que a IG Matas de Rondônia é a única de café que possui cafeicultores indígenas, e que já tem no etnoturismo uma nova fonte de renda para as famílias da aldeia.
Mulheres do Café e a exportação
Durante o evento foram realizadas ações voltadas para as mulheres que atuam na cafeicultura. Das amostras selecionadas para as degustações dos compradores, dez eram de mulheres, incluindo uma indígena. O cupping foi realizado de forma separada para que pudesse ser apresentado todo o trabalho que vem sendo feito para as mulheres do café em Rondônia, mas não houve separação na hora da seleção, que foi geral. Foram comercializadas ainda durante o evento 16 sacas de cafés de seis mulheres, sendo a saca da indígena Mapilacobar Solange Suruí a mais bem paga, R$4 mil, que foi para os Estados Unidos.
Os compradores puderam conhecer a história do Movimento das Mulheres do Café de Rondônia, que teve início em 2017, por meio do despertar da comunicadora da Embrapa e especialista em café, Renata Silva. Trata-se de um Movimento representativo para a região Amazônica, reunindo milhares de mulheres que atuam no setor do café por meio das redes sociais (Instagram, Facebook e WhatsApp) e também por meio de ações presenciais, dando voz, visibilidade, reconhecimento, oferta de oportunidades e acesso às capacitações. É uma organização civil, conduzida por voluntárias, sem fins lucrativos, sem vínculos políticos, partidários, ou institucionais e que tem promovido o protagonismo feminino aliado à agregação da família.
Para a idealizadora do Movimento, Renata Silva, em seis anos as mulheres saíram de uma condição de invisibilidade e estão assumindo o protagonismo na cafeicultura com foco na qualidade. “Nunca foi um movimento de segregação, trabalhamos com a sensibilização de mulheres e no seu despertar para habilidades e potenciais que podem promover o seu desenvolvimento e agregar a família por meio do café”, diz Renata. Segundo ela, contam com o apoio de instituições em diversas ações, como a Embrapa, a Aliança Internacional das Mulheres – IWCA Brasil, entre outras e buscam por oportunidades específicas para as mulheres, o que tem sido a base para os bons resultados alcançados nesses anos de trabalho.
A engenheira agrônoma e cafeicultora campeã em qualidade, Poliana Perrut, é uma das lideranças do Movimento e tem multiplicado o conhecimento adquirido, promovendo outras mulheres e famílias. “Eu consegui produzir cafés campeões e tenho como propósito que outras pessoas também consigam”, argumenta Perrut. A visibilidade e o reconhecimento das mulheres do café de Rondônia têm avançado divisas e inspirado mulheres também do estado vizinho, o Acre. É o caso da cafeicultora Keyti Espíndola, que tem uma lavoura na Reserva Extrativista Chico Mendes. “Me inspirei no trabalho que as mulheres fazem em Rondônia e que conheci pelas redes sociais. Hoje comercializamos nosso próprio café, temos uma renda melhor. O café trouxe dignidade para nossa família e está se tornando uma alternativa para nossa comunidade”, conta Keyti, que teve café comercializado nesta ação do Exporta Mais Brasil em Rondônia.
A outra ação voltada para as mulheres no evento foi um painel que promoveu diálogos entre lideranças femininas em diversas cadeias produtivas além do café: castanha, artesanato indígena e cosméticos com ingredientes da Amazônia. O objetivo foi sensibilizar e engajar empresas e autoridades estaduais para promover a cultura exportadora em alinhamento com as rodadas de negócio promovidas pelo Exporta Brasil. Sendo alinhadas ao programa Mulheres e Negócios Internacionais, que abordou a relevância da liderança feminina para o desenvolvimento sustentável da economia nacional e internacional, neste caso, em Rondônia, na Amazônia.
Cafeicultura em Rondônia
O estado é responsável por mais de 90% da produção de café na região Amazônica, é o quinto maior produtor de café do Brasil e o segundo da espécie canéfora (robusta e conilon). A cafeicultura tem grande impacto econômico e social para o estado, para se ter dimensão da produção, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 2022 o estado colheu 2,8 milhões de sacas de café de 60 kg beneficiadas em uma área de 65 mil hectares, com média de produtividade de 43 sacas de café por hectare.
Quanto à sustentabilidade, dados históricos da Conab sobre a cafeicultura na região mostram que, nos últimos 20 anos, houve uma redução de cerca de 70% da área de café em Rondônia e aumento em torno de 60% na produção, além de um salto de mais de 500% na produtividade. Isto demonstra que os cafeicultores estão usando de forma eficiente o solo e os outros recursos naturais, com produção em grande quantidade e em pequenas áreas, não avançando sobre a floresta, com atuação em harmonia. As lavouras são conduzidas por cerca de 17 mil produtores, em áreas com média de quatro hectares, em que a base da mão de obra é basicamente familiar, com a maior parte da colheita manual.
Rondônia também possui a primeira Indicação Geográfica (IG), do tipo Denominação de Origem (DO), para cafés da espécie canéfora sustentável do mundo: região Matas de Rondônia que produz os cafés da espécie canéfora denominados Robustas Amazônicos. São cafés que, de modo geral, apresentam doçura, sabores que lembram chocolate, frutas, especiarias e ervas. A IG é formada por 15 municípios que detêm mais de 80% da produção de café de Rondônia. Além disso, reúne mais de 10 mil cafeicultores de base familiar. Além de agregação de valor ao café pela qualidade, a IG tem impulsionado o desenvolvimento da região.
Fonte: Gazeta Central