O número de enterros nos cemitérios públicos de Manaus atingiu um novo recorde nesta quarta-feira (22). A estrutura insuficiente de atendimento a pacientes com a Covid-19 tem levado famílias ao desespero.
A técnica de enfermagem Jaina Ribeiro dos Santos gravou um vídeo nesta quarta pedindo um leito de UTI para o pai. Ela disse que há oito anos cuida das pessoas e que, agora, esperava ajuda para transferir o pai, internado em um posto de pronto atendimento.
“Se meu pai ficar lá, vai morrer, porque não tem como entubar, não tem respirador, as pessoas lá estão apavoradas porque não sabem como cuidar, elas não sabem o que fazer, e não têm recurso. Pelo amor de deus, me ajudem a conseguir um leito para o meu pai, eu imploro, eu imploro que alguém puder me ajudar de alguma forma”, pediu ela.
Com a repercussão do caso nas redes sociais, a Secretaria da Saúde transferiu o pai dela para uma sala de reanimação do Hospital 28 de Agosto, que serve de apoio para internar pacientes com Covid-19. Mas até agora ele ainda espera uma vaga para UTI.
“Como eu falei naquele vídeo, eu sou funcionária da saúde, eu trabalho nessa área me dedicando a cuidar de vidas, e eu me vi numa situação que o meu pai estava precisando desse cuidado e não estava sendo fornecido para ele. Foi uma sensação de mãos atadas diante de uma situação grave”, lamentou.
Além da falta de vagas na UTI, o 28 de Agosto também enfrenta a lotação do caminhão frigorífico que guarda os corpos de quem morreu pela Covid-19 ou de quem tinha a suspeita da doença. Um vídeo mostra os agentes funerários com dificuldade para mexer nos sacos com os cadáveres.
São quase 2.500 casos confirmados e mais de 200 mortes. O governo do estado admite que o número pode ser ainda maior. O sistema de saúde está no limite com 96% dos leitos de UTI dos hospitais públicos ocupados. Nos hospitais de apoio e prontos socorros, apenas casos gravíssimos estão sendo atendidos por causa da superlotação. E mesmo quem está em estado grave pela Covid-19 tem dificuldade no atendimento.
Geovane Reis, de 54 anos, saiu de Manacapuru, interior do Amazonas, já com dificuldade para respirar. Ele foi primeiro para o hospital de campanha, inaugurado na semana passada, mas que ainda não tinha leitos de UTI. De lá, seguiu de ambulância, com oxigênio já no fim, para o Delphina Aziz, hospital de referência para a doença. Ficou na enfermaria, porque as UTIs estavam lotadas. Não resistiu.
“Nem entrou, nem chegou a ir para UTI mesmo. Acho que ele bem ficou cinco, dez horas no Delphina. Morreu no mesmo dia que entrou”, contou Giovana Matos, assistente de dentista.
O caos na saúde do Amazonas por causa do novo coronavírus também continua impactando o sistema funerário. Nos últimos dias, os enterros passaram a ser coletivos e os caixões colocados em valas comuns. Nesta terça (21), foram 136 sepultamentos nos cemitérios públicos da cidade, um recorde que representa quase cinco vezes a média de enterros diários em Manaus.
O estado teme ainda que o sistema prisional possa ser o próximo alvo da doença. Nesta quarta, foi confirmado o primeiro caso de Covid-19 em um presídio. O homem cumpria prisão temporária e agora está internado num hospital de Manaus.
O pai da enfermeira Jaina foi transferido na noite desta quarta-feira (22) para a UTI.
Sobre o homem que morreu depois de procurar dois hospitais, a Secretaria Estadual da Saúde afirma que ele já chegou a Manaus em estado grave, que recebeu assistência adequada, mas que o quadro teve piora rápida.