A União Europeia é o segundo maior comprador do agronegócio brasileiro, tendo sido o destino de 17,6% das exportações do setor neste ano, que geraram US$ 9,9 bilhões até julho. Fica atrás apenas da China. Esse mercado poderia ser prejudicado após declarações recentes de autoridades europeias, que reagiram às queimadas na Amazônia.
Na última sexta-feira (23), a Finlândia, que está na presidência rotativa da UE, disse que pretende encontrar uma forma de fazer o bloco banir a importação da carne bovina brasileira por causa da questão ambiental.
No mesmo dia, a França voltou a cogitar se opor ao acordo entre o Mercosul e a União Europeia, no qual o agronegócio brasileiro é um dos beneficiados. E a Irlanda fez coro.
Carne bovina
O acordo Mercosul-UE abrirá uma porta para o Brasil aumentar o volume de exportações agropecuárias, mas já estão previstos limites para setores mais competitivos, como o de carnes.
O Brasil é o líder mundial na exportação de carne bovina e a União Europeia é o terceiro maior cliente, tendo movimentado US$ 336,3 milhões em compras no acumulado deste ano, de acordo com dados do Ministério da Agricultura.
Exportações de carne bovina em 2019 (jan. a jul.)
Destino | Volume (em tonedas) | Receita |
Hong Kong | 202,8 mil | US$ 649,3 milhões |
China | 174,9 mil | US$ 838,4 milhões |
União Europeia | 58,9 mil | US$ 336,3 milhões |
Total exportado | 981,7 mil | US$ 3,72 bilhões |
Nos sete primeiros meses deste ano, foram mandadas para lá 58,9 mil toneladas do produto. O volume só foi menor do que o exportado para Hong Kong (202,8 mil toneladas) e para a China (174,9 mil toneladas).
Em 2018, a União Europeia também foi o terceiro principal destino da proteína brasileira. O bloco comprou 118,3 mil toneladas, trazendo ao Brasil US$ 728,1 milhões em receita.
Exportações de carne bovina em 2018
Destinos | Volume (em toneladas) | Receita |
Hong Kong | 394 mil | US$ 1,44 bilhão |
China | 322 mil | US$ 1,49 bilhão |
União Europeia | 118 mil | US$ 728,1 milhões |
Total exportado | 1,64 milhão | US$ 6,54 bilhões |
Considerando todos os produtos do agronegócio, os mais vendidos para os europeus em 2019, até julho, foram grãos, óleo e farelo de soja (33,9%), produtos florestais (19,3%), café (13,6%) e carnes (7,5%).
Jogo político
Especialistas em comércio exterior ouvidos pelo G1 entendem que as declarações dos europeus também têm um contexto político, além da questão ambiental.
A França é a maior potência agrícola do bloco, concorrendo com o Brasil especialmente na produção de soja, leite e derivados. Em julho, logo após o anúncio do acordo Mercosul-UE, ela já tinha cogitado não aceitá-lo, também alegando questões ambientais. A Irlanda é um grande produtor de carne.
“A França é o país mais resistente (com o acordo UE-Mercosul) e o que o governo federal fez foi dar combustível para essas questões, atacando os líderes europeus de maneira explícita e com um recuo muito lento”, avaliou o professor de relações internacionais da PUC-RJ Carlos Frederico Coelho na última sexta.
“Não tem mocinhos. Macron não é inocente, mas é o jogo da política internacional. Houve inabilidade do governo federal e estamos pagando o preço”, completa Coelho.
Subsídios para a produção rural na União Europeia atingiu cifras bilionárias em 2017 — Foto: Diana Yukari/G1
Marcos Jank, coordenador do Centro de Global de Agronegócio do Insper, destaca que, por outro lado, a imagem do Brasil não estaria prejudicada junto à Ásia, principal cliente do agronegócio brasileiro no exterior.
Produtores pressionam governo
Além da forte reação internacional, integrantes do governo brasileiro relataram ao blog do Camarotti que a pressão interna do agronegócio brasileiro fez com que o governo mudasse de atitude em relação ao crescimento do desmatamento e das queimadas na Amazônia.
Na última sexta, Bolsonaro autorizou o envio das Forças Armadas para combater os incêndios na Amazônia. A Polícia Federal também vai investigar se houve convocação para queimadas no Pará no que seria chamado de “dia do fogo”, no começo do mês.
O ex-ministro da Agricultura e uma das lideranças do setor no Brasil, Blairo Maggi, disse que à BBC News Brasil que o país ficou com a imagem bastante arranhada. Eleitor de Bolsonaro, ele avaliou que os produtores rurais terão “muito trabalho pela frente” para voltar a ter credibilidade no comércio internacional.
Em evento na sexta, em Brasília, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, afirmou que as notícias preocupam. “Mas eu acho que a gente tem que baixar a temperatura”, afirmou, em referência às declarações da França.
“Nós não podemos dizer que, porque nesse momento nós temos um incêndio acontecendo ou uma queimada acontecendo na Amazônia, que o agronegócio brasileiro é o grande destruidor. E, portanto, vão fazer barreiras comerciais contra esse agronegócio”, concluiu.