Com o maior percentual de evangélicos do país, Rondônia celebra nesta terça-feira (18) o Dia do Evangélico. Para entender o fenômeno protestante no estado, o G1 conversou com líderes de algumas das maiores denominações evangélicas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os únicos dados oficiais do IBGE sobre os evangélicos em Rondônia são do Censo de 2010. Segundo o instituto, dados mais atualizados só serão obtidos no próximo Censo, marcado para o ano que vem.
No começo dessa década haviam 528 mil evangélicos no estado, sendo quase 34% dos habitantes. As maiores denominações em Rondônia são a Assembleia de Deus (177 mil), seguida pela Igreja Batista (48 mil), Adventista do Sétimo Dia (40 mil) e Congregação Cristã no Brasil (38 mil).
O historiador Marco Teixeira diz que os primeiros grupos de evangélicos na região datam do século XIX.
“Nós temos notícias de grupos protestantes nas primeiras tentativas de construção da ferrovia Madeira-Mamoré. A maioria deles pertencendo a religião anglicana ou a variações da Igreja Batista”
Quando começa o trabalho de construção da ferrovia, muitos barbadianos, que eram anglicanos, chegam em Porto Velho, segundo Teixeira. Parte deles se converte à Batista, Católica e outra parte mantém os cultos de matrizes africanas.
1ª Igreja Batista de RO
Localizada no Bairro Caiari, a Primeira Igreja Batista de Rondônia é a mais antiga em funcionamento do estado. O centenário da igreja será comemorado em 2021. Ainda na década de 1920 surge a Assembleia de Deus também com descendentes barbadianos.
O primeiro batismo assembleiano, com quatro fiéis convertidos foi realizado em 28 de fevereiro de 1928. Atualmente, o templo mais antigo de Porto Velho, e sede da igreja na capital fica na Rua José de Alencar, também no bairro Caiari.
Ainda hoje, o presidente da igreja é o membro de uma família de barbadianos. O pastor Joel Holder, de 76 anos, conversou com o G1 sobre a história da igreja e as pressões que ela sofre por mudanças, já que é uma das denominações mais rígidas em seus usos e costumes, como a proibição do uso de brincos ou calça comprida por mulheres.
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Pastor Joel Holder relembra história da igreja em RO — Foto: Diêgo Holanda/G1
“O caminho de salvação que nós anunciamos é o que Jesus ensinou. A pessoa é livre pra fazer o que quiser, mas nós temos um direcionamento de postura. Agora se a pessoa não quer seguir, aí é problema dela. Alguns que querem mudar, saem pra outra igreja que é liberal, mas muitos voltam”, diz.
Terceira maior denominação do estado pelos dados do IBGE, a Igreja Adventista do Sétimo Dia (Iasd) teve os primeiros cultos em Rondônia na década de 1940, no bairro Areal em Porto Velho.
Atualmente são 104 igrejas apenas na capital e mais de 400 em todo o estado sendo frequentadas por aproximadamente 40 mil membros, segundo a Associação Amazônia Ocidental da Igreja (Aamo).
Segundo o presidente da Aamo, Emerson André Campanholo, um dos desafios da denominação é mostrar que os adventistas vão além dos esteriótipos de guardar o sábado e não comer carne de porco.
Campanholo acredita que o grande número de evangélicos no estado está diretamente relacionada a formação da população em ciclos migratórios.
“Nós cremos também que, pelo estado de Rondônia, muita gente vem na migração de outros estados e quando eles saem das famílias, eles buscam esse encontro novamente com outras famílias, relacionamento com outras pessoas e a igreja facilita muito isso. Eu creio que por isso Rondônia é um dos estados mais evangélicos”, diz o líder adventista.
Entre as estratégias de expansão usada pelos adventistas em Rondônia está a entrega de livros, duplas missionárias e a Educação Adventista, uma rede de escolas com 6 unidades no estado.
Dentre a população com renda maior que 10 salários mínimos, os evangélicos se tornam minoria, segundo os dados do Ibge.
Para alcançar as classes mais altas, uma estratégia dos adventistas foi a criação de uma igreja em Porto Velho com estrutura de teatro, num ambiente mais escuro e com luzes coloridas, louvor mais animado e mensagens bíblicas contextualizadas com assuntos culturais e científicos.
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Imagem mostra Igreja Teatro — Foto: Reprodução
“A cultura religiosa não muda princípios, mas pode mudar formas. Essa forma é mais contextualizada, mais jovem, mais intimista, não tem a claridade. É todo um sistema que influencia pra que se preste mais atenção. Então aquilo envolve as pessoas”, justifica Emerson Campanholo.
Para o doutor em ciência da religião e professor de Sociologia da Universidade Federal de Rondônia (Unir), Edson Modesto Araújo, o crescimento acelerado no número de evangélicos não necessariamente reflete práticas profundas na religião.
“As religiões se proliferam porque estão vendendo experiência religiosa. As pessoas querem ir na igreja e ter uma experiência religiosa. Ela chora, tem uma relação espiritual, com o transcendente, oferta por aquele momento específico. Mas na segunda-feira, o dia dela é normal, ela continua brigando no trânsito, tendo negócios ilícitos, porque elas estão em busca de uma experiência e não uma consciência religiosa”, analisa.
O historiador e professor Marco Teixeira defende que a ocupação do espaço religioso rondoniense pela igreja evangélica está relacionado com o vazio deixado pela Igreja Católica durante a povoação do estado na segunda metade de século XX, com a oposição do governo militar à Teologia da Libertação católica.
Outra razão apontada por ele é a chegada rápida dos ministérios evangélicos aos novos espaços populacionais, como as invasões em áreas urbanas, por exemplo.
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Primeira Igreja Batista de Rondônia — Foto: Diêgo Holanda/G1
“Elas chegam muito rapidamente porque são estruturas montadas individualmente, que não dependem de uma organização complexa igual à da Igreja Católica. Outro fator que facilita a propagação é a inexistência de um clero submetido a uma série de ordenamentos”, diz.
Marco também acredita na ausência do estado com serviços públicos como motivo do crescimento das igrejas pentecostais e ”neopentecostais” nas periferias.
“As igrejas se fortalecem nas áreas onde o estado é fraco, onde falta assistência, não há saúde e a educação é um problema. Nesses lugares há um campo muito fértil para a esperança religiosa como única alternativa”.