A Defensoria Pública do Estado de Rondônia (DPE-RO) informou nesta terça-feira (28) ter solicitado que a Polícia Federal (PF) informe sobre as investigações do assassinato do indígena Ari Uru-eu-wau-wau. O crime ocorreu há 10 dias em Tarilândia, distrito de Jaru (RO). O caso começou a ser apurado pela Polícia Civil.
A DPE, em nota, disse acreditar que há indícios de que o crime “pode ter ocorrido no contexto de invasões e grilagens” que assola as terras do povo (veja comunicado ao fim desta reportagem).
O G1 entrou em contato com a Polícia Federal para um possível pronunciamento sobre o pedido da defensoria. Porém, a corporação não deu retornou o pedido até a última atualização desta reportagem.
Ambientalistas chegaram a declarar que Ari, então de 33 anos, já vinha sendo alvo de ameaças de morte meses antes.
A WWF-Brasil revelou que o território Uru-eu-wau-wau passa por invasões, sobretudo por parte de grileiros incentivados pelas medidas de afrouxamento na fiscalização e punição. Para o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a morte do indígena Ari já vinha sendo anunciada há muito tempo.
O foco do trabalho de Ari era registrar e denunciar extrações ilegais de madeira dentro da aldeia, pois fazia parte do grupo de vigilância do povo indígena Uru-eu-wau-wau. Além disso, a vítima era prima de Awapu Uru-eu-wau-wau, liderança indígena que já sofreu diversas ameaças de morte.
Entenda o caso
O caso do indígena foi registrado como homicídio doloso (quando há intenção de matar).
A primeira linha de apuração da Polícia Civil analisava a morte como proveniente de um acidente de trânsito, mas as investigações tomaram outro rumo, já que o corpo de Ari foi encontrado jogado de um lado da estrada e a motocicleta do outro lado da pista. Manchas de sangue ligavam o caminho da moto ao corpo.
“Onde ele morreu é um local que a gente não costuma parar. Meu pai mesmo conta a história que ali não tem pessoas boas. Naquela região tem casas de invasores”, disse Tangãe Uru-eu-wau-wau, irmão de Ari.
Conforme relatos de Tangãe, a vítima havia saído da aldeia no dia 17 de abril, uma sexta-feira, por volta das 18h. A preocupação começou porque ele estava demorando muito para voltar. “Ele não voltou pra casa aquela noite”, lembrou.
Somente no sábado de manhã a família soube da morte e foi ao local para reconhecer o corpo. Quando Tangãe chegou, a polícia e o carro da funerária já estavam no local. Segundo ele, a moto estava do lado direito da estada, sentido aldeia, e o corpo jogado no lado oposto.
“Ele estava de costas pra cima e peito pra baixo. Tinha sangramento na boca e na nuca dava pra ver uma marca, tipo uma pancada bem forte. Eu vi a marca do pneu de uma moto, provavelmente estava sendo perseguido, eu não sei. Ninguém sabe de verdade. Tinha sangue na estrada, no meu entender ele foi arrastado. É muito triste a gente ficou muito abatido”, disse.
Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Ari Uru-eu-wau-wau era casado e tinha dois filhos – de 10 e de 14 anos de idade.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) afirmou ao G1 que as circunstâncias e a autoria do crime já estão sendo investigadas, e que acompanha a Polícia Civil e se encontra à disposição para colaborar no que for possível com o trabalho das forças de segurança pública que atuam nas investigações.
Invasões
A terra indígena Uru-eu-wau-wau, é considerada por ambientalistas da Kanindé como uma das mais importante de Rondônia por ter nascentes dos 17 principais rios do estado além de fauna rica, com vários animais ameaçados de extinção como Gavião Real, cachorro vinagre, entre outros.
“Além de ser casa para cinco povos indígenas: Jupaú (Uru-eu-wau-wau), Amondawa, Cabixi, Oro Towati (Oro win), e três povos em isolamento voluntário (índios isolados). A vegetação é riquíssima também com vegetação ameaçada. Possui cerrado, floresta ombrofila densa e aberta. As cavernas possuem inscrição rupestres que até agora não foram estudadas”, disse Ivaneide Bandeira, ambientalista da Kanindé.
A TI Uru-eu-wau-wau junto com a terra indígena Karipuna, está no ranking de áreas mais desmatadas em Rondônia. Com uma área que abrange 153 mil hectares, entre 2008 e novembro de 2019, a terra Karipuna teve 33,17 km² de desmate.
Queimadas na terra indígena Uru Eu Wau Wau — Foto: Reprodução/TV Globo
Já a Uru-Eu-Wau-Wau, que tem ao todo 1.857 mil hectares de área, perdeu 42,54 km² no mesmo período, conforme dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes).
Juntas, a soma de terra perdida em cerca de 11 anos é de 75,71 km², o equivalente a quase 13 campos de futebol do tamanho do Maracanã, no Rio de Janeiro
Confira na íntegra a nota da DPE-RO:
Nota da Defensoria Pública do Estado de Rondônia – Núcleo de Direitos Humanos e da Coletividade – NUDHC
É fundamental que a Polícia Federal investigue a morte do professor Ari Uru Eu Wau Wau, pois há indícios de que este crime bárbaro pode ter ocorrido no contexto de invasões e grilagens das terras desse Povo.
Segundo a Anistia Internacional, a terra indígena do Povo Uru Eu Wau Wau tem sofrido sucessivas invasões por parte de grileiros e madeireiros.
O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de Rondônia já oficiou à Superintendência da Polícia Federal, pedindo informações sobre as investigações dos fatos acima aduzidos.
Acreditamos na capacidade técnica e inteligência da Polícia Federal, o que resultará na elucidação deste caso.