A romancista Allison Hope fala sobre como lidar com inseguranças e incertezas na pandemia.
Nota do editor: Allison Hope é uma escritora nova-iorquina que prefere o humor à tristeza, as viagens à televisão, e o café ao sono.
Em uma recente ida ao supermercado, eu tentei e falhei miseravelmente em abrir uma sacola para enfiar meus brócolis sem precisar lamber meus dedos para ganhar a tração necessária. Não lambi o dedo como costumo fazer porque, bem, é uma pandemia.
Minha frustração só aumentou quando todas as tentativas inúteis de fazer as coisas que fazem qualquer ser humano normal fizeram meus óculos embaçarem e eu não conseguia mais ver a sacola que estava tentando abrir. Tentei me conter para não jogar a cabeça do brócolis de volta à gôndola, gritar e sair correndo em direção a um precipício.
O sucesso de 1986 de Janet Jackson, Control, me veio à cabeça. “É tudo uma questão de controle”, ela canta, “e eu tenho muito disso.”
Todos nós teríamos mais controle em 1986 do que temos agora. Ou talvez você esteja cantando a música Losin Control, de Russ. Tudo bem também.
A Covid-19 e a sensação aparentemente interminável de incerteza que veio com ela nos privaram de grande parte do controle que tínhamos antes da pandemia. Com essa perda, vem a dor. Isso resultou em um espectro de desespero, ansiedade, depressão e desamparo que podem prejudicar a produtividade e nossa capacidade de nos conectarmos com outras pessoas.
“Lidar com a Covid-19 não estava em nosso repertório de suportar situações estressantes”, disse Susan Albers, psicóloga da Cleveland Clinic, que dedicou sua carreira a pessoas com problemas de controle emocional.
“Não existe um manual para lidar com a Covid. Não há modelos ou pesquisas bem documentadas que indiquem como lidar com uma pandemia global de forma eficaz. A Covid requer um novo conjunto de habilidades de enfrentamento que muitas pessoas nunca tiveram que exercitar.”
Concentrar-se no que você pode controlar, disse ela, pode ser um passo para mitigar esse sentimento de impotência.
Tentar entender a perda de controle
É uma abordagem que ajudou Emily Oster, famosa professora de economia e políticas públicas da Brown University. Oster dedica seu tempo a fazer análises baseadas em dados que ela ajuda a processar. Mas até ela se desesperou com a perda de controle em sua vida durante a pandemia, o que a fez se desviar da sua relação com números e escrever uma coluna com um tom pessoal, e sem dados.
“Escrevo este texto porque estou vendo muitos e-mails e mensagens de pessoas que parecem estar lutando contra a mesma coisa. Um dia, me peguei xingando meu suporte para mangueira no porão e parei para refletir por que eu estava fazendo aquilo. Eu sentia que havia uma ameaça contra a única coisa sobre a qual eu sentia que tinha controle, minha pista de patinação no quintal”, disse Oster por e-mail.
“A pandemia removeu muitas opções para muitos de nós e acho que deixou muitas pessoas lutando contra coisas que, geralmente, saberiam manejar. Para mim, reconhecer isso me ajudou a me perdoar por estar obcecada de maneira, muitas vezes, irracional sobre coisas que eu tenho o controle”, disse ela.
A psicóloga de Cleveland, Susan Albers, concordou.
“Quando você se sentir fora de controle, lembre-se daquilo que você controla e daquilo que você não pode controlar. Não desperdice sua energia com coisas que você não tem poder de mudar”, disse Albers.
Ela sugeriu tarefas como listar as coisas que você controla para manter sua família segura, como lavar as mãos e distanciar-se socialmente.
Como recuperar o senso de controle
Uma simples atitude ajuda a focar a atenção no presente, diz Albers.
“Você não pode controlar o futuro, mas tem o poder de tornar o presente agradável”, disse ela.
Eu perdi o controle ao tentar algo tão simples, como colocar uma cabeça de brócolis em um saco. Era mais do que meu cérebro poderia calcular, e o suficiente para me colocar no limite. Para tornar um momento como esse mais agradável, eu poderia ter optado pela entrega de alimentos em casa. Isso teria evitado um colapso nervoso no corredor do supermercado.
Albers disse que também pode ajudar tentar alguns “exercícios de reflexão”, nos quais você se concentra na respiração e nos sentidos – uma espécie de meditação – para tentar interromper a perda de controle. Um exemplo é colocar as mãos na água e focar na sensação da água em suas mãos. Experimente diferentes temperaturas, quentes e frias, e observe como é a sensação da água em sua pele.
Outros exercícios de reflexão – que na verdade são apenas subterfúgios para “criar uma distração e se desviar dos pensamentos ansiosos” – podem incluir dar uma caminhada, alongar-se ou focar na identificação dos ruídos que você ouve em um determinado momento. Você também pode tentar um exercício simples, recomendado pela psicóloga: cite cinco coisas que você vê, quatro coisas que você sente, três coisas que você ouve, duas coisas que você cheira e uma coisa que você prova.
Evite notícias deprimentes ou o apocalipse das redes sociais porque eles podem “desencadear uma enxurrada de sentimentos negativos e a sensação de que a situação está fora de controle”, disse Albers. Escolha um período durante o dia para se conectar às redes sociais e, em seguida, desligue-se para não ser arrastado pela ansiedade.
Se tudo mais falhar, pode valer a pena buscar a inspiração de uma das mais importantes professoras budistas ocidentais, Pema Chödrön, que nos incentiva a abraçar o que ela chama de “perder o chão”.
“Estar totalmente vivo e desperto e se sentir completamente humano é entender que, constantemente, somos jogados para fora do ninho. Viver plenamente é estar sempre no que se pode chamar de terra de ninguém, experimentar cada momento como completamente novo e fresco. Viver é estar disposto a morrer indefinidamente”, disse Chodron em seu livro” Quando tudo se desfaz.
Essa atitude, de deixar acontecer, não significa que você precisa desistir de controlar coisas que estão ao seu alcance. Mas, sim, que que você está desobrigado a controlar aquilo que não está sob seu poder.
Por isso, acrescentarei um capacete e joelheiras ao meu guarda-roupa durante a pandemia e vou me preparar para ser jogada para fora do ninho. Se eu tiver sorte, talvez consiga sorrir ao cair de lá.
Fonte: cnn.com